

Quando da publicação da obra “Direitos Humanos: Visão multidisciplinar Contemporânea”, pela editora Autografia em novembro de 2018, a qual fomos um dos autores, muito se falou sobre este tema, mas como evoluiu e como está hoje? Fizemos uma análise crítica, na época e ainda vale a discussão, pois recentemente vimos o quanto hoje o desemprego afeta a vida dos brasileiros.
O Direito do Trabalho no Brasil, sofreu evolução à medida que se verificavam os avanços obtidos desde a Constituição de 1824 até a de 1988. Getúlio Vargas, político de cunho muito populista, impulsionou todos os movimentos neste sentido e, por consequência acabou por conquistar a confiança da classe operária da época, e se dedicou a buscar atender os pedidos dos trabalhadores.
Posteriormente devido as leis trabalhistas estarem dispersas com legislação ampla no sistema, a organização foi necessária e dada a partir da disposição sistemática na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), constituindo o Decreto-lei 5.452 de 1.º de maio de 1943, servindo de instrumento para que Getúlio Vargas conquistasse a classe operaria e por conseguinte cair no esquecimento os desastrosos fatos ocorridos durante o período da Segunda Grande Guerra.
A Constituição de 1967 conseguiu firmar os direitos trabalhistas anteriormente previstos, incluindo, por vez, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (Lei 5.107, de 13 de setembro de 1966). Aliando-se a esse tempo, dispositivos de empregos domésticos, contratos de trabalho, normas rurais de trabalho e trabalho temporário, foram dispostas pela Lei 5.859 de 11 de dezembro de 1972, esta revogada a partir da Lei Complementar 150 de 1.º de junho de 2015.
A Constituição de 1988, a partir de 5 de outubro daquele ano, tem disposições que tratam do direito do trabalho previstas em seu título II, capítulo II que concerne aos direitos sociais e, paralelamente, aos direitos e garantias fundamentais, do art. 7º ao 11º. É de extrema importância, a garantia desses direitos, sejam individuais ou não, pois estão em sintonia com princípios de dignidade e igualdade apresentados pela Declaração Universal dos Direitos Humanos.
A partir deste marco que foi a promulgação da Carta Magna de 1988, se esperava um avanço sem precedentes das relações entre obreiros e patrões no nosso País, porém não foi o que se viu nestes últimos anos. As crises econômicas e a falsa ideia de estabilidade econômica, deixou muito trabalhadores sem saída, tendo que sujeitar-se a qualquer condição de trabalho para manter-se no emprego e sustentar sua família.
Tal constatação é possível, ao analisar com acuidade os processos trabalhistas, especialmente nos últimos dez anos. As suas particularidades assustam, pois se verifica, ainda que de forma velada violações aos mais básicos direitos da pessoa humana, em especial a dignidade.
Ao conviver diariamente nos Fóruns e Tribunais Trabalhistas, chega causar espanto quando se verifica dos pedidos (requerimentos) iniciais nos processos. É bem verdade que há muito exagero, narrativas e ilações sem qualquer fundamento, mas há casos que são reais e ferem de morte todo o sistema de proteção do empregado, e por conseguinte os mais básicos direitos de sua existência.
Cargas de trabalho estafantes, menores em idade escolar com carga horaria de adulto, exploração da dignidade humana ao extremo. Isso, pasme, existe em uma sociedade tida como evoluída ao máximo, com recursos de tecnologia e informática quase inimaginável, e tendo como realidade em alguns casos, os mais arcaicos atos de exploração humana ocorridos no início da civilização.
São fatos que ocorrem em pleno século XXI, e que parecem inimagináveis, como o caso de trabalhadores que foram resgatados de situação análoga à escravidão em uma operação realizada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), Ministério do Trabalho (MTb) e Polícia Federal entre os dias 20 e 25 de janeiro de 2024, em Mato Grosso do Sul. As ocorrências foram identificadas em fazendas próximas aos municípios de Corumbá e Dois Irmãos do Buriti, segundo o sitio do Ministério Público do Trabalho.
E tudo aos nossos olhos e das autoridades competentes, porém poucos atos concretos de verdadeiro combate a violação, no seio da sociedade, dos direitos humanos. Não se fala de uma operação ou fiscalização de um caso ou outro, mas sim de políticas e ações públicas de verdadeiro combate a essa exploração diária que nos cerca.
E isso pouco aparece, pouco se discute, mas o simples fato de um trabalhador estar sendo forçado constantemente a fazer horas extras acima do permitido em lei, passa primeiramente pela ofensa ao mais básico dos direitos humanos: a sua dignidade.
E são inúmeros outros casos, como trabalhar sem EPIs, sem proteção adequada contra produtos perigosos, sem roupa adequada, entre outros. E quando isso acontece, a humilhação que o ser humano é exposto, fere de morte a sua dignidade, a sua autoestima. E tais fatos ocorrem diuturnamente de maneira quase velada.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos diz no art. 4° que “Ninguém será mantido em escravidão ou servidão. A escravidão e o tráfico de escravos serão proibidos em todas as suas formas” e no Art. 5° que “Ninguém será submetido a tortura, nem a castigo cruel, desumano ou degradante”.
Não restam dúvidas que recentes avanços na promoção dos direitos humanos têm sido constatados. Apesar desse trabalho considerável e inovador de sua promoção, não existe ainda clara compreensão da universalidade e indivisibilidade dos mesmos, sejam civis, políticos, sociais, econômicos e culturais.
Mas o fato é que estamos falando de casos acontecidos em 2024, em pleno século XXI, algo que atualmente apenas e tão somente somam para a estatística, já que os não param, e devido à crise econômica, a falta de aparelhamento do Estado, aliada a crise nos países vizinhos, especialmente a Venezuela, apenas e tão somente agravam a situação. O cenário é típico para a exploração do indivíduo que necessita do mínimo para se manter e, ante a assombrosa demanda de pessoas que necessitam trabalhar, não é raro acontecer a exploração.
Os que não tem emprego se sujeitam a qualquer condição e os que estão empregados também, já que precisam manter seu trabalho. Essa situação favorece a exploração e por conseguinte o ferimento à dignidade do homem, o seu mais básico direito, assim como a vida.
Ter uma vida digna sendo explorado, é impossível, e é por esse caminho tortuoso que estamos sendo levados, a sociedade ante a tantos problemas sociais e políticos não está vendo que, estamos violando direitos humanos diariamente, quando se trata de relação empregatícia.
Existe um número muito alto de pessoas que continua a encontrar grandes dificuldades no exercício de sua cidadania e de seus direitos fundamentais, nesta relação de subordinação. É preciso agir de modo a conscientizar a todos, seja com políticas públicas, seja com campanhas ou mesmo com mudança brusca de legislação.
Ainda que se tenha tentado uma mudança recente, a chamada reforma trabalhista (Lei 13.467/2017), esta não foi discutida o suficiente com os interessados, e ainda teremos que esperar muitos para sentir mudança ou resultado real. A realidade é que avançamos muito nesta relação, mas deixando alguns pontos básicos sem qualquer proteção. Hoje não raro encontramos situações de “exploração institucionalizada” na relação empregatícia, até porque passa por uma questão de “sobrevivência” na nossa sociedade que é capitalista. Mas isso não pode ser regra, não pode existir, não pode ser aceito de forma alguma.
Tal condição deve ser debatida e averiguada a fundo, já que estamos diante de uma violação básica de Direitos Humanos em pleno Século XXI, no seio de uma sociedade tida como evoluída.
É indiscutível que os direitos humanos são garantidos em todas as esferas da vida do ser humano, e também não pode deixar de ser no Direito do Trabalho, até porque o trabalho é a mola mestra da sociedade, já que movimenta em todos os aspectos da produtividade, inclusive área econômica, e os Direitos Humanos por sua vez vem proteger o indivíduo e tende a limitar quaisquer agressões que este possa vir a sofrer em razão do seu trabalho, frise – se “qualquer agressão”.
Necessário se faz afirmar e reafirmar que há em regra, uma relação de hipossuficiência entre empregado e empregador, e tal condição torna ainda mais importante a existência dos Direitos Humanos dentro do Direito do Trabalho, para que o “poder” do empregador não venha a ferir em momento algum os direitos de seus empregados, que são acima de tudo seres humanos com todos os seus direitos assegurados pela Constituição Federal, Consolidação das Leis do Trabalho, e em especial pela Declaração Universal dos Direitos Humanos. Também cabe reforçar que a sociedade precisa de políticas públicas efetivas no sentido de reforçar esta relação empregado/empregador e conscientizar de maneira mais clara a todos os envolvidos, porém antes se faz necessário que o país tenha um crescimento econômico grande e não ande na contra mão da economia mundial, e com isso gerando empregos dignos.

Bento Adriano Monteiro Duailibi
Advogado, Professor Universitário,
Pós Graduado em Direito Civil e Metodologia do Ensino Superior,
Membro da Academia Maçônica de Letras de MS.